A Perspectiva Estratégica
Foi-se o tempo em que seletos grupos na torre de marfim da alta cúpula das empresas mantinham-se dedicados à estratégia – quase um exercício logístico de equilibrar a demanda de oportunidades de mercados em franco desenvolvimento ou o simples projetar o futuro como tendência do passado. Eram como que privilegiados seres capazes de perscrutar o desconhecido e dele extrair sua essência traduzida em belíssimos “Planos Estratégicos” que eram entregues à média gerência para que tratasse de fazer com que as pobres almas encarregadas das operações, os executassem.
Aquela prática foi substituída, na empresa enxuta – por absoluta falta de tempo das pessoas – pelo culto radical à eficiência operacional como se esta fosse a fonte da vantagem competitiva. O resultado: especialistas funcionais encastelados, cada um na torre de marfim do seu departamento – centros de excelência na solução de problemas. E problemas são conseqüências do passado!
Se antes tínhamos uma completa dissociação entre aqueles que só pensavam no futuro e os que faziam o presente, hoje perdemos a capacidade de prospectar o futuro. Não só porque temos menos tempo, mas porque ele se tornou mais complexo e incerto. Um alvo móvel!
Uma pesquisa recente revela que menos de 2,4% do tempo dos executivos é dedicado a pensar num futuro superior a dois anos para suas empresas. Invariavelmente um convite a pensar no futuro encontra barreiras quase intransponíveis. Tempo é a primeira. Mas as mais impermeáveis são sem dúvida de natureza inconsciente e cultural. Precisamos de fortes e persistentes estímulos para descolar dos nossos redutos de especialidade funcional e do presente.
A complexidade do ambiente competitivo e a velocidade das transformações nele ocorridas exigem a re-configuração das nossas competências. Em todos os níveis hierárquicos precisamos competências estratégicas, humanas e técnicas. É verdade que na alta direção as competências técnicas são menos requisitadas do que as estratégicas. O contrário também é verdade no nível operacional. E no nível gerencial todas têm igual importância e exigência. Não se trata mais de “ou estratégico, ou operacional”, mas sim de estratégico “e” operacional. De presente e futuro. De especialista e generalista. De empresa e departamento. De processo e função. De pensar e agir estrategicamente.
Ver a empresa de uma perspectiva estratégica exige que desprendamo-nos da visão de especialista. Procurar observar o ambiente de diversos pontos de vista diferentes daquele em que nossa rotina insiste em nos colocar. Em especial, precisamos vê-lo (o ambiente) a partir da cúpula, sob uma concepção mais generalista.
Outra exigência da perspectiva estratégica é a percepção tetradimensional (4) do ambiente. O presente é sólido - tridimensional. O hoje é uma conseqüência das decisões, ações e omissões de ontem. O ambiente competitivo e empresarial está em processo – e ele ocorre na quarta dimensão. A quarta dimensão é a duração – o tempo transcorrendo. O futuro é conseqüência de um presente se movimentando. Precisamos ser capazes de observar o processo de transformação que está ocorrendo. Sem dúvida, que o médio e longo prazo têm um lugar de destaque nessa perspectiva.
Orientação prática é o terceiro requisito da competência estratégica. Quando fazemos um esforço para descolar do presente e da rotina temos a tendência de alçar vôos, por vezes siderais. Manter forte vínculo entre a estratégia e a ação é fundamental e crítico. Se não for assim, papeis (e arquivos eletrônicos) estarão sendo acumulados, sem serventia, nas prateleiras e drives de computador.
Ao nos dedicarmos à perspectiva estratégica assumimos responsabilidade sobre importantes decisões como: investimentos e/ou dês-investimentos; a integração dos negócios da empresa; a orientação do portfólio de produtos e/ou serviços; o modelo de gestão, a estrutura e os processos organizacionais. Geralmente estas são as decisões mais irreversíveis e difíceis de tomar. Exigem mais racionalidade e análise técnica.
E por último, não menos importante, é exigida atitude sistêmica e persistente de manter viva a perspectiva estratégica na empresa. É comum, nas empresas, a criação de um espaço anual de dois ou três dias para o “planejamento estratégico”. Melhor que nada! Mas, empresas que querem construir o futuro precisam pensar e agir estrategicamente como rotina não como um evento anual.
Você é nosso convidado nessa viajem exigente e recompensadora!
Miguel Scotti. Este artigo foi escrito como introdução à Estratégia e Gestão Estratégica para os participantes de treinamento em Planejamento Estratégico.